Por: Gregorio Lucio
A Umbanda é uma religião
riquíssima em seu imaginário e em seu mundo simbólico. Ambos alimentam a
ampla diversidade ritual que existe nas mais diversas tradições
seguidas em cada cazuá.
É pela ritualidade que se cumpre o processo prático religioso na Umbanda. A ritualística é fundamental para a transmissão simbólica da energia psíquica mobilizada em seus trabalhos mágico-espirituais. Toda a experiência religiosa feita dentro dos círculos umbandistas centra-se nos ritos.
O ritualismo, entendido como um sistema litúrgico que contempla um conjunto de ritos, promove a sujeição do adepto à experimentação ritual e a introjeção dos significados dos símbolos que neles (nos ritos) congregam-se, com o objetivo de repetir ou reviver (pelo menos na tentativa de) uma experiência individual transcendente de comunhão com o Sagrado.
Contudo, muitas vezes o ritualismo pode tornar-se um veículo estéril para essa experimentação. Principalmente quando há um apego desproporcional ao zelo das normas contidas na tradição religiosa em prejuízo ao espírito de abertura para a figura humana do adepto religioso com a sua subjetividade.
Uma vivência em torno de ritos e símbolos que não acompanham o desenrolar da jornada humana no suceder do tempo social, histórico e psicológico compromete seu poder de mobilização de energia psíquica/anímica pois sofre um processo de esvaziamento de significados e deixa, aos poucos, de ser uma experiência atrativa para o espírito. Essa é uma reflexão sempre válida no ambiente religioso. O ritos, símbolos e crenças devem carregar um discurso e uma transmissão de sentidos que tenham conexão com a realidade interior das pessoas de hoje para que possa conservar seu poder de atração.
Isso porque o excesso de ritualismos e a ausência de símbolos suficientemente significativos acaba por sufocar a individualidade do adepto e não permitir o seu desenvolvimento interior, prendendo-o num círculo repetitivo de vivências superficiais e exteriores e com pouca penetração em seu universo íntimo, para promover significativas transformações. Os resultados possíveis, ao final, são os sentimentos individuais de cansaço, acomodação, alienação e vazio.
O valor de um símbolo religioso ou de um ponto de crença não pode ser de maior relevância do que a pessoa que o vivencia, assim como não deve ser maior do que a natureza do trabalho que esta desenvolve.
Devemos refletir sobre as práticas rituais e qual a sua real penetração e valor no processo de transformação e melhora individual dos seguidores da religião de Umbanda. Em que contribuem, se de fato contribuem e até que ponto contribuem para a sua transformação íntima?
Caso contrário, o zelo pela tradição e o apego ao simbolismo estéril pode fazer-nos cair em um farisaísmo moderno, repleto de normas, excesso de zelo pela tradição e pouca abertura para uma real conexão entre a vida religiosa do adepto e o seu mundo de relação diária. Ou, o que é pior: a distorção psicológica do adepto a respeito das relações entre a sua vivência religiosa e a vivência social diária, por achar que uma não tem ligação ou repercussão sobre a outra ("faço o que bem entender da minha vida, desde que eu 'cumpra as obrigações' dentro do meu terreiro").
E tudo isso por conta de uma experiência desconectada de um senso de realidade prática e pouco atraente ao mundo interior do adepto umbandista que deseja uma vivência mais profunda de valores e centrada em uma compreensão abrangente da vida humana.