terça-feira, 9 de dezembro de 2014

A Visão de um Adepto: Sobre o Movimento Umbandista


Por: Gregorio Lucio


Sim, este texto trata de um sentimento de indignação e preocupação.

Embora a Umbanda seja uma religião com pouco mais de um século de existência (pelo menos, oficialmente), o movimento umbandista tem muitíssimo ainda para amadurecer. Provas disso podem ser encontradas nos fóruns de discussão e grupos espalhados pela rede.

Aliás, quando das minhas incursões pelo meio espiritista, percebia que os fóruns e grupos tinham como objetivo (salvo raras exceções, como sempre) a disputa vaidosa e arrogante para ver quem tinha mais conhecimentos e argumentos para derrubar as ideias e elucubrações de outrem no que se referia a questões de reflexão para o campo doutrinário kardequiano.Ou então, a divulgação maçante, tola e sempre repetitiva de mensagens genéricas, correntes, etc.

Pelo visto, os Umbandistas também não escaparam dessa postura vazia, em seus grupos virtuais. E isso com acréscimo de elementos para pior se comparado com aqueles da ordem dos grupos kardecistas.

Vemos isso nos fóruns e grupos umbandistas. Perguntas sobre conceitos básicos de mediunidade ou da própria Umbanda. Dúvidas sobre como interpretar uma vela queimada (?????), exibição de guias (colares) colocados sobre o peito desnudo de cidadãos que se dizem médiuns de terreiro e que tiram selfies no quintal e nas salas de suas próprias casas. Venda de guias por encomenda. Oferta de consulta com entidades via WhatsApp e Skype. Cursos de Simpatia e Benzimentos pela internet (???).

Ou então, "no dia do orixá (ou do santo) tal, eu faço oferenda de que?". "Quem é do Santo (ou Orixá) tal"?. "Quem conhece a história do Guia fulano?". Falas sempre repetidas, como "O meu Guia isso"; "o meu orixá aquilo". O "meu", o meu, o meu... Ou seja, situações que evidenciam uma exibição narcisista e infantil que na verdade demonstra só o quanto se é leigo naquilo que se diz crer e seguir.

Fotos particulares do momento do Amací (que aliás, essa lá é hora de tirar foto?), da Coroação, do ponto que o Guia deu. Coisas que deveriam ficar guardadas na intimidade do médium e de seu terreiro e não expostas a pessoas que o indivíduo sequer conhece.

Pessoas de terreiros rivais se ofendendo. Comércios variados de camisetas, velas, banhos, roupas, despachos, jogo de búzios, tarot, etc.

E quando se trata de Exú e Pombagira, então...aí é uma festa. Foto de Pombagira andando de moto, falando no celular e tomando cidra barata. Exú servindo churrasco e abrindo lata de cerveja. Pessoas vestidas em trajes...digamos...esquisitos... Aliás, tem uns grupos que deveriam se chamar Grupo do Exú e da Pombagira e não "Grupo de Umbanda", porque 90% dos comentários, fotos e discussões são sobre eles, parecendo que só eles existem ou tem representatividade nesse universo religioso. Freud (e Lacan) explica.

Uma busca predominante por exterioridades, mágicas, fórmulas, orações e simpatias vazias. Apego a crendices e superficialidades circulares, que não tiram ninguém do lugar (interiormente).

Raros são aqueles que se dignam a colocar a discussão num nível mais maduro e decente, citando um fato histórico, uma atuação politizada de alguma casa umbandista, as iniciativas de algumas instituições ou lideranças, os grupos de estudos, a graduação em nível superior de Teologia Umbandista, as palestras, a defesa por alguma causa (religiosa ou social), os valores da religião, o real sentido da vivência religiosa, etc. Por breves momentos fico feliz, pois penso que nem tudo está perdido e que nosso meio não está dominado somente por sucatas e lixos que são despejados por pessoas vazias, supersticiosas, limitadas e ignorantes (na acepção literal do termo), que se dizem médiuns e iniciados e que muitas vezes nem uma mensagem em português minimamente compreensível conseguem escrever.

Mas logo a discussão é abafada por algum "manézinho" que já vem perguntar se deve acender vela pro Exú na encruzilhada, no cemitério ou na casa dele (!!!). Ou que a entidade fulana "pegou" ele(a) na rua e fez se machucar, se mutilou, fez ficar doente disso e daquilo. Ora, faça-me o favor.

Tudo isso para apontar que, como umbandistas, embora seja difícil admitir, ainda caminhamos numa "infância" espiritual muito grande. Embora existam profundas verdades e lições de inestimável valor espiritual por trás da manifestação de cada entidade, dos ritos e da tradição de cada templo, estas ainda permanecem veladas e ocultas aos olhos de muitos que ainda se demoram numa conduta irresponsável, distraída e vazia.

O que comprova isso é essa realidade vista nos ambientes virtuais. Lembro que parte destes que espalham esse monte de idéias, discussões, mensagens, imagens, crenças e princípios superficiais e esdrúxulos nos fóruns e grupos de discussão, são integrantes (pelo menos boa parte deles são) de muitas casas espalhadas por todo o país e que levam para esses lugares uma parte de seu reflexo espiritual como adeptos umbandistas.

Enquanto isso, nossas casas permanecem repetindo discursos genéricos sobre caridade, espiritualidade, mediunidade, os quais geralmente são emprestados de outras crenças, como o Kardecismo, a Igreja e o Candomblé. Ou inventamos e ensinamos doutrinas mágicas, fantasiosas e distantes da realidade existencial do homem, incoerentes com seu tempo histórico, social e psicológico (salvo raras exceções).

Vejo com preocupação e temeridade essas questões, pois, enquanto dure e predomine essa mentalidade tacanha, cheia de crendices. mantenedora da ignorância e da irresponsabilidade de seu corpo de adeptos, caminhamos seriamente para um ostracismo e uma possível paralisação espiritual ao longo do tempo. Corremos o risco de ficarmos relegados a condição medíocre de uma seita com ares circenses, tida como populada por ignorantes, doentes psiquiátricos e excêntricos de toda espécie.

Oremos uns pelos outros, conforme meus mais velhos me ensinam, para que não caiamos nessa roda de purgação pela nossa incúria e obscuridade espiritual.

Bom, mas dizem que o futuro a Deus pertence, não é?

Que Ele nos abençoe.

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